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31 de março de 2017

DESAPAIXONANTE --- EPISÓDIO 4x03: PEDRO & OLÍVIA



(Denner)


É difícil dizer com precisão quando os pensamentos orais começaram. O caso é que, depois dos vinte anos, eles infernizaram boa parte da minha vida. Incontroláveis, indomáveis, além de excessivamente estranhos. Hoje, aos 30, por mais que tenham cessado um pouco, ainda sou um escravo do desespero pelas quase sempre vãs tentativas em evitá-los. Já até cheguei ao cúmulo de cogitar que bom seria se eu simplesmente não pensasse mais em coisa alguma. Imagine só! O que seria do mundo se as pessoas evitassem pensar? E é com esse fardo que eu tenho de lidar, sempre me policiando para não deixar escapar alguma ideia íntima demais, arriscada demais. Todo mundo sabe que os pensamentos podem carregar em si a gene das atitudes mais perigosas, então é aterrorizante imaginar as pessoas tendo acesso a isso, mesmo que seja um acesso limitado ou involuntário.
Definitivamente, eu não teria uma carreira promissora como um poderoso vilão. Na melhor das hipóteses, talvez conseguisse ser um vilãozinho meia-boca de alguma novela chinfrim ou filme de orçamento irrisório. Sim, porque seria ridículo um vilão cujos planos maléficos nem sempre ficassem guardados em sua mente maligna. Os mocinhos sempre obteriam alguma vantagem, além de fazer troça da minha debilidade.
“Pra quem acabou de ser ameaçado de morte, até que ele tá normal”, avalia Pedro.
Ah, sim. Ainda estou aqui no apartamento 815, acoado por um misterioso casal que alega ter vindo buscar minha namorada para “voltar para casa”.
Pelo visto, não expressei meus pensamentos anteriores oralmente. Ufa!
“Vamos ter sua colaboração ou não, Denner?”, insiste Olívia.
Ajeito-me no sofá, olho de um para o outro e ainda fingindo não estar muito desconfortável, questiono:
“Vocês não acham que seria melhor se eu soubesse exatamente o motivo de vocês estarem querendo a minha... colaboração?”
“Já explicamos”, responde Olívia.
“Não podemos dar muitos detalhes”, complementa Pedro. “E, cara, sério, a gente gostaria muito de resolver essa situação sem derramar sangue inocente”.
“Mas também não seria um incômodo, caso fosse necessário”, diz Olívia, com um sorrisinho safado no rosto.
Essa mulher me dá medo.
“Bom, nesse caso”, volto a me ajeitar. Será que meu medo está ficando tão evidente quanto eu não gostaria? “Então o jeito vai ser vocês me matarem. Vão fazer isso aqui mesmo?”
“Tudo bem”, contenta-se Olívia, como um iceberg encarnado, reerguendo o revólver em minha direção. Essa mulher parece desconhecer até a função de piscar. O indicador está no gatilho.
“Para com isso, sua maluca!”, berra Pedro, forçando-a a baixar a mão.
Minha boca está semiaberta e meus olhos não creem no que acabo de ver. Ela ia de fato me matar!! Ela ia me matar com certeza.
“Deixe de tomar as decisões sozinha, Olívia”, repreende Pedro. “Nós fomos contratados juntos para o trabalho. Contenha-se!”
“Eu sou prática, Pedro, acho que você já deveria ter percebido isso”.
“É, mas uma decisão extrema como essa não pode ser executada com tanta praticidade”.
“Você é tão entediante”, boceja ela.
“E você é tão irritante!”, devolve ele.
“Qual é a sua ideia então? Ele já disse que não vai nos ajudar”, argumenta Olívia.
“Eu ouvi o que ele disse. Mas ao contrário de você, eu gosto de racionalizar a situação, entendeu? Você entende o significado dessa palavra, Olívia? Hein? Racionalizar? Você sabe o que significa isso?”
“Sim. Significa enrolar pra matar uma pessoa totalmente descartável que, no fim das contas, vai acabar morta de qualquer jeito. Eu não vim aqui pra brincar. Eu não me dei o trabalho de vir até aqui pra perder tempo com racionalizações, Pedro”.
“O cara tá assustado com a gente. É com essa atitude que você quer recuperar a Rita Lina e levá-la pra casa? Acho que não, Olívia. Às vezes, a melhor arma é o carisma de uma pessoa simpática que sabe atrair em vez de afastar”.
“Escutem”, tento me meter na discussão.
“Isso tudo me parece pura frescura de quem não tem colhões pra fazer o que deveria”, replica Olívia.
Gente, será que...”, continuo persistindo em me meter.
“Colhões? Olha aqui, você para de levar tudo pra esse lado, tá entendendo? É muito infantil ter de apelar pra esse tipo de argumento achando que vai me convencer”.
“Eu não estava apelando pra nada, seu melindroso. Quem leva tudo pra esse lado é você”.
“Olívia, eu nunca disse que não mataríamos o Denner. Eu só disse que não precisamos fazer isso ainda. Você devia ser péssima em provas de interpretação de texto, não é?”
Ela põe a mão na cintura com ar de riso, respondendo:
“Você vai precisar de muito mais do que uma ofensazinha ao intelecto se quiser me atingir, meu caro. Além do mais, essa informação nem sequer estava implícita na sua fala”.
Pedro suspira de raiva.
“Eu te odeio, Olívia Dantas!”
“Vindo de você, não poderia me sentir mais honrada, Pedro Bispo!”
“PAAAAAREEEEEMMMMMM!!!!”, grito com todo o ar dos pulmões. Sei que parece estranho dizer, mas sinto o vermelho se apoderando da minha pele, evidenciando a força que empreguei neste grito.
Entretanto, vale a pena. Tenho a atenção de ambos.
“Vocês não têm um pingo de pudor em falar na frente de uma pessoa que pode ser que ela morra? Cara, quem são vocês?”
Apesar de quietos, eles não denotam vergonha alguma. Isso que eu chamo de separar profissionalismo e sentimentos pessoais.
“Por favor”, peço, tentando me recompor. “Será que vocês podem me dar um tempo pra pensar em como vou ajudá-los?”
Eles se entreolham, desconfiados da minha proposta.
“Ué, tô falando sério. Ora, o que eu poderia fazer? Fugir? Vocês me encontrariam, não é mesmo? Vocês são bons nisso, não são?”
“Somos, mas dá um trabalhão”, admite Olívia. “E eu já estou querendo encerrar esse caso, então já que você está aqui, não faz sentido te dar um tempo. Pelo menos não muito”.
Que droga! Essa Olívia é como uma torre de pedra bruta indestrutível.
Pedro ratifica:
“Olha, Denner, eu detesto admitir isso, mas essa mulher aqui está certa. Você não faz ideia do quanto dá trabalho ficar indo atrás das pessoas”.
“Porém”, intervenho, “como você mesmo falou, Pedro, as melhores armas são carisma e simpatia, portanto eu deveria ir até a Rita primeiro e ir preparando o terreno, já que como namorado eu passo mais confiança e uso de muita simpatia e carisma ao lidar com ela. Só que essas coisas levam tempo, não podem ser de hoje pra amanhã como vocês querem. Me deem uma semana. Aí eu aviso vocês quando eu vir que ela já está pronta pra aceitar a ideia de que precisa voltar pra casa, o que quer que isso signifique. O que acham?”
Novamente eles se entreolham. Novamente desconfiados. Essa dupla é casca-dura. E eu estou contando com uma sorte sem igual para não deixar nenhum pedacinho de qualquer pensamento vazar. É o esforço mais descomunal que um ser humano pode aplicar à própria mente. Bem, um ser humano que sofre de complicações ao tentar guardar para si o que pensa.
“Uma semana...”, pondera Pedro.
“Eu já estou ficando cansada desse lugar”, queixa-se Olívia.
“Mas a proposta é excelente”, reitero.
“Acho que ele tem razão, Olívia. Afinal, a gente nem explicou direito os nossos motivos de querer levar a Rita Lina embora. E se a gente quer que ele nos ajude, não tô vendo outro jeito”.
“Seu coração é pior que o de uma mãe, Pedro”, responde ela.
“Não tenho culpa se você é mal-amada”, rebate ele.
“Por favor, não comecem”, intrometo-me. “Podemos fechar nesse acordo ou não?”
“Por mim, sim”, Pedro até sorri e me estende a mão.
“Por mim também, mas eu não vou oferecer minha mão pra você apertar”.
“Não liga, Denner. A Olívia é azeda mesmo”.
“Ironicamente, faz mais sentido não apertar a mão dela do que apertar a sua, Pedro. Afinal, eu ouvi você dizendo que eu poderia ser morto, só que não imediatamente”.
“Ih, me pegou!”, ele dá de ombros, com um sorriso encabulado.


Naquele dia, saí do apartamento 815 com a cabeça prestes a explodir, feito uma bexiga que não suporta mais que bombeiem ar para seu interior. Fiquei boa parte dos momentos finais pensando em uma fila interminável de patinhos marchando numa rodovia movimentada. Assim como os pensamentos orais, também não sei quando comecei a apelar para esse tipo de saída para “bloquear” a mente dos reais pensamentos. O problema é que nem sempre dá certo.
Se servir para alguém, aí vai: imagine uma rodovia dessas bem caóticas, com carros indo e vindo, veículos de todos os tamanhos, com motoristas dos mais variados humores, especialmente os estressados. Agora imagine que num ponto da pista um bando de patinhos, um bando enorme, absurdamente organizado numa fileira e, como eu disse, interminável, começa a cruzar a pista. O número de patos precisa ser infinito porque assim o pensamento fixo nessa visão perdura o tempo que você precisar para bloquear o que quer que esteja sendo arquitetado em sua mente.
E, enquanto dava esse deleite um tanto esdrúxulo à minha mente, fui enganando Pedro e Olívia me oferecendo para colaborar com eles nesse plano descabido de levar Rita para casa. Mas que casa, meu Deus do céu? A casa dela é lá onde ela vive com seus pais, numa vida feliz e sossegada com seus pequenos absurdos e uma obsessão por transitar por diversos empregos.
De onde saiu essa história e essa missão confiada a Pedro e Olívia? De que casa eles estão falando? E estão sob ordens de quem?
O caso é que eu tenho uma semana pra dar um jeito nisso, pra descobrir uma forma de livrar Rita e sua família de uma enrascada. Era isso que passava pela minha mente enquanto eu disfarçava tudo com pensamentos de patinhos cruzando uma rodovia agitada e causando um tremendo caos no trânsito.
Alguns dias se passaram e eu só tenho três dias para encontrar uma solução.
O telefone toca. Comprei um novo, bem simplesinho, após ter perdido um num incêndio durante um serviço para a ANNA.
“Alô!”, atendo com certa expectativa, pois é um número desconhecido.
“Alô, Denner! Aqui é a Olívia!”
Droga!! Tava pensando nesse satanás agora mesmo...
“Entendo a hostilidade, de verdade”, responde ela, fazendo-me entender que o xingamento de satanás foi mais um pensamento oral. Porém, há algo estranho em sua voz.
“Desculpa te chamar de satanás, é que... Bem, não preciso explicar, você disse que já entendeu. Então, o que você quer? Ainda não acabou o prazo”.
“Preciso de uma ajuda sua”.
“De novo?”, aborreço-me. “Olha, que tipo de trabalho você faz, hein? Nunca resolve sozinha, tá sempre pedindo ajuda”.
Essa minha coragem latente se deve ao fato de não ter Olívia a poucos passos segurando uma arma.
“O Pedro sumiu. E eu não conheço essa cidade muito bem, só que eu preciso encontrá-lo. Você é a única pessoa com quem temos contato aqui”.
“Ah, é mesmo, é? Huuummm... Deixa eu ver se entendi. Você apontou uma arma pra mim sem pestanejar e, peraí, peraí, peraí!! Não!! Você não fez só apontar uma arma pra minha cara, você ia puxar o gatilho, lembra? E agora você está querendo a minha ajuda?! É isso mesmo?”
“Sim, é exatamente isso. Pode me encontrar aqui no prédio?”
“Claro! Será uma honra maravilhosa ir até aí. Eu estou totalmente disponível pra me encontrar com uma pessoa que não me matou por um triz, e ajudar em tudo que essa pessoa precisar, embora não tenha o menor cabimento”.
“Ah, que ótimo!”, ela exprime um suspiro de alívio genuíno. “Vou descer daqui a vinte minutos, te espero na recepção”.
Além da cretina não reconhecer o peso do meu sarcasmo tão óbvio, ainda foi mal-educada e nem se despediu, desligando na minha cara.
Vou ter de denunciá-los à polícia. Essa questão é inadmissível. Eles me impingem o pânico de um assassinato iminente e ficam me pedindo ajuda como se tudo que tivesse acontecido não passasse de um episódio besta de bullying na escola.
Entretanto, eu não os conheço. Não sei do que são capazes. E preciso descobrir o porquê de eles estarem atrás da minha namorada. Logo, não posso me dirigir à delegacia mais próxima e dar queixa deles.
O jeito é continuar dando corda. Mais por amor pela Rita do que qualquer outra coisa.


Chego de táxi ao prédio Oceânico, onde Olívia e Pedro estão hospedados. É um nome bem curioso para um prédio de apartamentos, já que não há qualquer sinal de mar por perto. Enfim.
Mal desço do carro, Olívia já vem ao meu encontro. Usando o mesmo terninho preto de ótimo caimento que trajava na primeira vez em que a vi, agora ela está com os cabelos loiros presos num coque. Seus olhos azuis cravam em mim com uma gelidez que me faz tremer a espinha por um momento. De alguma forma, ela me faz lembrar de uma diretora que tive na época do ensino fundamental, que distribuía suspensões aos alunos como quem distribui camisinhas no carnaval. Nós a chamávamos de “chefona”, em alusão aos vilões que aparecem nas fases finais dos videogames. Certa vez ela ouviu um dos meus pensamentos orais e concluiu que eu havia criado o maldito apelido, e não deu outra: tomei uma suspensão tão longa que acabei emendando com as férias de Julho. Na época até que não foi tão mal, mas ela me obrigou a pagar no contraturno todas as aulas perdidas, com sua irmã gêmea. O boato na escola é que, das gêmeas, a Chefona era a boa, enquanto sua irmã era a má. Eu tive o desprazer de comprovar que não eram boatos. Eu e os calos dos meus dedos.
Mas chega disso, é tudo passado.
“Vamos no meu carro”, avisa Olívia.
“Que bom, porque eu não tenho carro”.
Olívia faz um gesto para eu a seguir para o outro lado da rua, onde um Siena preto peliculado está estacionado.
“Então, por onde começamos?”, ela indaga, já dando a partida no automóvel.
“Como assim?”, eu a encaro com a cara mais indignada que eu consigo imprimir.
“Eu te avisei que eu não conheço a cidade direito. Essas ruas estão todas muito confusas, então preciso que você me ajude a ir atrás do Pedro”.
Passo a mão na testa, agoniado e impaciente.
“Olha, eu não sei o que foi que você bebeu, mas não tem como eu saber onde o Pedro pode ter se enfiado. Eu conheci vocês dois quatro dias atrás. Então eu claramente não tenho a menor ideia de onde ele possa estar. Você não tentou ligar pra ele?”
“Ele não levou o celular”.
“Claro que não levou”, resmungo. “Vai ver ele só quer ficar um tempo longe de você”.
“Duvido. Ele não consegue se virar sem mim”.
“E parece que você não consegue se virar sem mim. Mas eu já disse que eu não posso ajudar”.
“Você se subestima, Denner. Acabou de jogar uma luz no problema”.
“O quê? Que luz?”
“Você disse que não sabe o que foi que eu bebi. E isso me fez lembrar que o Pedro é chegado numa birita. Se eu fosse ele, com certeza ia procurar um bar pra passar o tédio. Nossa única questão agora é ir de bar em bar até encontrá-lo”.
E é assim que as improbabilidades continuam seguindo firme e forte na minha vida...


Já passamos em seis bares e nenhum rastro de Pedro. Enquanto o carro avança rumo ao próximo bar, tudo que eu consigo fazer pra passar o tempo é olhar a paisagem e a noite que vai se alastrando com mais ímpeto, embelezando tudo ao redor com aquele ar misterioso e elegante que há nas trevas.
Desde que eu conheci Pedro e Olívia (e agora aqui, dividindo espaço com ela neste carro), venho refletindo sobre meu trabalho como agente do desapaixonamento. Desde que comecei a trabalhar na ANNA, minha vida tem passeado cada vez mais por circunstâncias bizarras. Quero dizer, minha vida nunca foi um atestado de normalidade, o suprassumo do ordinário, mas certamente não tenho mais vivido dias monótonos e sem-graça como na época da faculdade ou mesmo durante o emprego como auxiliar na capela funerária, e olha que eu achava esse trampo bastante excitante e vivificador, apesar deste trocadilho.
Arranjar esse emprego na ANNA me fez descobrir que ainda há muita vida a ser experimentada. Contudo, já é a segunda ou terceira vez que me vejo em perigo por conta desse trabalho. Quando o senso de aventura começa a ganhar ares nebulosos, o horizonte fica turvo e a gente não sabe ao certo quando é a devida hora de parar. Os riscos ficam mascarados e não é impossível se perder nesse nevoeiro.
E eu ainda alimento o sonho de me tornar um grande escritor um dia... Caramba, são tantos pensamentos flutuando...
“Você sempre tem essas... esses... como é que se chama isso?”
“Isso o quê?”
“Quando você fala, mas parece que tá falando sozinho, como se estivesse contando um segredo, só que em voz alta. Tem um nome bonito pra isso ou é só loucura pura?”
Meneio a cabeça, tentando ignorar o que ela diz.
“É sério, eu fico preocupada em ter alguém no meu carro que fica falando sobre uma tal de ANNA e depois fala que quer ser escritor, mas aparentemente uma coisa não tem a ver com a outra. Se for alguma doença bizarra, me diz logo”.
Pelo visto, meus pensamentos orais dessa vez saíram fragmentados, o que explica ela ter tido uma compreensão parcial e limitada. Por ora, vou continuar sem dar maiores explicações a ela.
“Eu sei que fui um pouco precipitada naquele lance de quase atirar em você, mas não precisa ser desagradável comigo, ok?”
“Olívia, quando você fala, você escuta sua própria voz?”
“Sim, naturalmente”.
“E na sua cabeça não toca alguma espécie de alarme pra te avisar que você tá falando merda? Sei lá, você não tem algum filtro pro que diz?”
“Por que tá perguntando isso?”
“O problema é que eu tô tão chateado que nem tenho vontade de te explicar”.
“Normal. As pessoas não têm muita paciência comigo mesmo”.
Quase dá para sentir um resquício de humanidade nela, pela forma como acabou de falar. Não resisto e explico:
“Bom, você acabou de reconhecer que se precipitou ao apontar uma arma pra mim e quase apertar o gatilho, mas acha que eu tô errado em te tratar como eu tô te tratando por achar que aquela tensão que você me fez passar não foi nada”.
“Hum”.
“E mesmo tendo me ameaçado de morte dentro do seu próprio apartamento, pra você isso foi tão banal que dias depois você me liga como se nada tivesse acontecido. Foi por isso que eu perguntei se você não tem algum alarme que te incomoda quando você fala coisas indevidas”.
Ela balança a cabeça afirmativamente, demonstrando estar acompanhando minhas palavras. Mas muito concentrada no trânsito.
“Terminou?”
“É... Acho... Acho que sim”.
“Hummm...”
Mais à vontade, repouso a cabeça no banco de carona onde estou. Olívia mexe no som do carro e põe uma música.
“Vocês conhecem David Bowie aqui?”, pergunta, com uma sombra do que me parece ser entusiasmo. Essa mulher é difícil de decifrar.
“Como assim? O David Bowie é conhecido no mundo inteiro!!”
“Ele é demais, né?”
“Conheço poucas músicas dele, incluindo essa aí”.
A música em questão é Heroes, uma das mais famosas do camaleão do rock. Já a ouvi no filme As vantagens de ser invisível, durante uma cena icônica com aquela atriz que interpretou a Hermione nos filmes do Harry Potter. Emma alguma coisa.
“Meu sonho é ver um show dele”, ela comenta, ensaiando um esboço de alegria, mas sem exibir um sorriso.
“E como vai fazer isso? Vai comprar um ingresso pro além?”
Ela tira um pouco o foco da direção e me lança um olhar confuso, como que esperando por alguma gargalhada após uma piada.
“O David Bowie morreu, você não sabia? Foi no início do ano”.
Ela dá uma freada brusca, de fazer os pneus cantarem estridentemente. Se eu não estivesse com o cinto bem afivelado...
“Desculpa, eu...”, Olívia está abalada. Só que eu estou mais abalado do que ela por tê-la ouvido pedir desculpas.
“A gente já passou da metade de 2016 e você é tão fã do David Bowie que não sabia que ele tinha morrido. Já ouviu falar de Internet?”
“Essa realidade é uma porcaria”, sussurra ela, apesar de parecer que não foi uma mensagem dirigida a mim, mas a si mesma. “Vamos continuar a viagem”, ela torna a se comunicar comigo.
E o carro prossegue na busca por Pedro. E eu prossigo entendendo cada vez menos do que está se sucedendo.


Mais doze bares e nada. Estou aliviadíssimo por estar em segurança pois, num dos bares visitados, um cara resolveu cantar Olívia e outro cara saiu em defesa dela. Começou como uma discussão sobre assédio e tal, até que se formou uma verdadeira briga com direito a garrafas e cinzeiros voando e tumulto generalizado. Do meio pro fim, um terceiro cara provocou o segundo por causa de time de futebol, no que um quarto cara se sentiu ofendido e xingou a mãe do terceiro cara, mas a mãe desse terceiro cara estava no recinto e, com a presença tão impactante quanto à de um pugilista peso-pesado, ela mandou o cara “cair dentro se ele fosse homem mesmo”.
No meio da algazarra, Olívia permanecia fria e tácita, perambulando pelo local à procura de Pedro, desviando feito ninja das garrafas, copos, cinzeiros e até  de cinco ou seis porta-canudos. Eu observei tudo de trás do balcão, agachado junto com o barman, que suplicava agarrado a um terço católico pra quebrarem menos coisas esse mês. Sua devoção foi drasticamente interrompida quando um corpo de homem foi arremessado para cima do balcão, desacordado e com o nariz escorrendo sangue e ranço.


Outra vez no carro, pergunto:
“Por que você simplesmente não espera o Pedro em casa? Ele já é bem crescidinho pra você ficar indo atrás dele, colocando a mim e a si mesma em confusão”.
“Mas eu não criei confusão nenhuma. Você me viu interagindo com alguém naquele bar? Nem boa-noite eu dei pra ninguém ali”.
“Com certeza não deu mesmo”.
“O caso é que o Pedro e eu fomos contratados juntos. Não vou receber a minha grana se nós dois não cumprirmos juntos a missão, entendeu?”
“Sei. E quem foi que contratou vocês? E qual é a missão exatamente?”
“Você sabe qual é a missão. Pelo menos em parte você sabe. E sobre quem nos contratou, bela tentativa, mas com certeza não vou te contar. Nossa missão é confidencial”.
“Mas como vocês esperam convencer a Rita Lina a ir com vocês sem contar a ela sobre essa tal missão?”
“Você faz muitas perguntas, Denner. Me deixa dirigir, tá bom?”
“Você é ingrata pra caramba, Olívia”.
Ela está certa. Melhor deixar o silêncio pairar absoluto.
Eu poderia estar em casa agora, descansando de mais um dia de trabalho. Ou com a minha namorada vendo documentários sobre etnias excêntricas ou dando gargalhadas assistindo TV Senado. Ou escutando ela tagarelar sobre suas convicções amalucadas e suas histórias de extraterrestres. Ou poderia estar tentando escrever um conto novo, quem sabe até um romance...
Mas não. Estou desperdiçando uma bela noite ao lado de uma desconhecida que poderia ter dado cabo de mim quatro dias atrás, da forma mais banal, e meu cadáver provavelmente teria sido ocultado num buraco qualquer e jamais, jamais meus familiares, minha namorada e Sávio teriam notícias de mim.
Sobreviver a tantas humilhações e rejeições para chegar até aqui, desfrutando de um bom emprego e uma namorada maravilhosa, para depois morrer nas mãos de uma dupla de estranhos que agem como se estivessem num planeta exótico. Não! Não posso permitir isso.
Estou tendo pensamentos muito peculiares agora. Mais do que isso: perigosos. É a hora perfeita para devanear com o bando de patinhos cruzando a rodovia movimentada.


“Você tem certeza?!”, Olívia inquire, quase numa súplica.
“É a nossa última esperança”, retruco, morto de cansado.
Já passa de onze da noite e perdi a conta de quantos bares já visitamos após o incidente no bar onde houve a pancadaria coletiva. Estou um pouco tonto. No bar anterior, havia uma comemoração para quem fosse o centésimo cliente a pisar lá esta noite. E quem deu o azar? Nem preciso dizer...
O caso é que fui obrigado a entornar dezenove doses de vinho de variadas marcas, onde eu poderia escolher o rótulo daquele que mais me agradou e levar para casa uma garrafa. Acabamos sendo enxotados porque eu não tenho o costume de beber e vomitei boa parte do conteúdo ingerido nos pés do proprietário do bar. E isso bem na hora da transmissão ao vivo que eles estavam fazendo pro Facebook.
Olívia disse que me protegeu de uma bota que alguém atirou contra mim, mas eu não tenho como confirmar a veracidade dessa informação, porque nessa hora o mundo estava girando descontroladamente.
“Denner, isso não é um bar. É uma espelunca de quinta categoria. Não parece fazer o tipo do Pedro”, ela analisa aquele que eu espero que seja o último local onde vamos hoje.
“É. De fato, é um boteco bem feinho mesmo”.
Decidida, ela marcha firmemente em direção ao boteco. Tem um nome ridículo de “Bar do Pezão", é mal iluminado e há algumas pessoas berrando animadíssimas já na calçada. Além dos berros, há um grupo de pessoas jogando dominó numa mesa, um indivíduo mais esparrento do que o outro. Para completar a trilha sonora, um DVD da banda Calypso está rolando num volume desesperador.
“O desgraçado tá aqui”, constata Olívia, enxergando Pedro finalmente.
Ele está sentado próximo a uma mesa de bilhar, com dois homens e uma mulher que traja uma camisa do flamengo. Sobre uma mesa, alguns copos americanos e uma garrafa de cerveja suando de gelada.
Rapidamente, Olívia é crivada de olhares. Não quero soar preconceituoso, mas pela forma como ela está vestida, parecendo uma agente de polícia, noto que alguns frequentadores começam a adotar uma postura de receio e desconfiança. Mal sabem eles que ela decerto não está lhes dando a mínima.
“Já chega, Pedro!”, ela já se aproxima incisiva. “Vamos embora agora!”
“Olívia, sua cobra venenosa!”, ele lhe dirige um xingamento, só que em tom de saudação, com um sorriso brilhante no rosto e um olhar marcante de quem está com o cérebro encharcado de álcool.
Olívia faz sinal pra um homem que ela julga ser o dono do lugar, para que ele traga a conta.
“Aaaah, mamãe, me deixa ficar mais cinco minutos!”, zomba Pedro, com a brancura de sua pele transformada num agoniante tom de vermelho de quem já está pegando fogo por dentro de tanto beber. Sua careca brilha como se tivesse acabado de ser polida.
Suas companhias na mesa, visivelmente bêbadas também, começam a rir de sua piada.
“Você gostou dessa, não foi, Valquíria?”, ele se dirige à moça com camisa do flamengo, erguendo um copo em direção a ela.
Olívia vai até o balcão, conversa qualquer coisa com o Pezão (quero dizer, eu acho que ele é o vulgo Pezão e que o bar tem esse nome porque ele tem esse apelido). Parece que ela pagou a conta.
“Vamos, Pedro! Você já se divertiu muito por hoje”, ela se comunica com uma paciência zen-budista admirável.
“Eu tava precisando disso. Você devia ter vindo comigo, Olívia”.
“Sim, sim, claro. Agora vamos”.
“Tá legal”, concorda ele. “Mas antes, você precisa ver uma coisa linda. Liiiinda demais, Olívia. Eu fico até arrepiado só de lembrar, ó!”
Ele estica o braço pra exibir o suposto arrepio, mas apenas a moça com a camisa do flamengo e os dois rapazes lhe dão atenção. Eu, por minha vez, só quero ir embora, principalmente porque tem uma quarentona numa mesa no canto da calçada me encarando e me deixando constrangido. Eita!! Ela acaba de dar uma piscadela e mexer a língua naquilo que, pra ela, parece a coisa mais sexy do mundo.
“Olha aquilo, Olívia!”, Pedro aponta para a TV onde Joelma e Chimbinha cantam e dançam alucinadamente, anos antes do fatídico divórcio.
Para minha completa surpresa, Olívia está olhando. E contemplando a imagem. Parece uma criança diante de uma situação inesperada. No entanto, ela não está encantada. Sua fisionomia mais se assemelha ao desprezo, embora ainda pareça perplexa.
“Essa música não é linda, Olívia? Presta atenção nessa batida. Eu simplesmente tô amando demais!”
Nunca vi alguém tão impressionado com a banda Calypso. Se bem que, pelas horas que estamos procurando Pedro, ele está bem bêbado, então...
“Que foi?”, resolvo me manifestar. “Vai dizer que nunca ouviu falar da banda Calypso?”
“Essa é a coisa mais estranha que eu já vi”, declara Olívia.
“Hummm... Tem coisas mais estranhas, mas no momento e na atual circunstância, vou concordar com você”, falo, dando mais uma olhada no ambiente que nos circunda.
A quarentona da mesa do canto se levantou e começou a dançar a música que está tocando no DVD, dessa vez se insinuando pra mim e tentando bater cabelo que nem a Joelma. Me bate uma certa pena porque ela não tem um dos braços e, mesmo assim, se esforça para mostrar que é participante ativa da sociedade e que gosta de se divertir. Em outra ocasião, eu ficaria grato pela gentileza em querer me seduzir, mas não tá dando pra lidar com o vexame dela. É desconfortável demais. Ou, como um agente da ANNA testificaria: é muito desapaixonante.
“Vamos embora”, determina Olívia, pegando Pedro pela mão como se ele fosse seu filho.
Graças a Deus!
“Tchau, galera. Eu considero vocês pra caraaaambaaa!! Vocês moram aqui no meu coração!”, ele vira a cabeça enquanto é conduzido por Olívia, batendo com a mão fechada de leve no centro do peito. “Não esquece de me ligar, Genésio!”



Pedro está encolhido no banco de trás, enquanto eu estou no de carona e Olívia se mantém na direção. Optamos pelo silêncio. Pelo menos até ele começar a tagarelar:
“Amanhã eu quero vir de novo”.
“Pra que? Pra ser depenado outra vez?”
Melhor nem me meter e deixá-los se entenderem sozinhos.
“Que nada, Denner, fica à vontade”, autoriza Pedro.
“Obrigado, Pedro, mas eu vou ficar na minha”.
E ele começa a cantarolar a música do cavalo manco.
“Dá pra acreditar no que a gente viu, Olívia?”, ele para a cantoria abruptamente.
“Agora não, Pedro. Estou dirigindo!”
“Você parece uma velha rabugenta!”, reclama Pedro.
“Pedro, eu verifiquei seus bolsos, sua carteira sumiu. Se eu demorasse mais um pouco, iam desovar seu corpo em alguma vala qualquer nesse fim de mundo. E você ainda quer voltar? Não. Eu tenho uma boa grana pra receber e não é você que vai me atrapalhar. Então, sim, se eu tiver que bancar a sua mãezinha, é isso que eu vou fazer. Mas depois que a gente completar a missão, nunca mais quero ver a sua cara”.
Rapaz...
“Rapaz o que, Denner?”, ela se irrita.
“Desculpa, foi um pensamento oral. Não era pra você ouvir. Eu achei que tava pensando, mas saiu pela boca. Melhor voltar a pensar nos patinhos”.
“Patinhos?!”
“Esquece”.
E Pedro começa a se rasgar numa gargalhada vigorosa, enquanto tenta entremeá-la com mais trechos de músicas da Calypso. Olívia está visivelmente incomodada.
“Você tem que dar um desconto pro cara”, banco o advogado. “Ele tá bêbado. Acho que é normal um bêbado se comportar assim. Amanhã ele nem vai se lembrar disso. E depois você vai até poder zoar com ele porque com certeza ele vai morrer de vergonha quando souber que virou fã de carteirinha da Banda Calypso”.
O que é que estou fazendo? Tentando criar um clima amigável com estes dois, sobretudo com Olívia, a mais assustadora. Por que a minha vida é tão essencialmente estranha?
Possivelmente para calar tanto a mim quanto Pedro, ela seleciona mais uma música do Bowie. Essa eu também conheço, The man who sold the world, uma pérola que o Nirvana fez o favor de regravar e, de quebra, estragar.
“A presi... tava... cant... na... TV... dan... Calypsoooo!”
Só ouço trechos dos berros de Pedro atrás de mim porque Olívia deixou o volume no máximo, de propósito. Estou me enchendo desses dois nessa guerrinha fria e idiota entre si. Tomo uma atitude e desligo o som.
“Ei!”, Olívia se indigna e para o carro.
Eu quero ouvir o que ele tá dizendo. De repente ele tá passando mal. Já pensou se ele morre aqui? O cara tá bêbado que nem um gambá”, explico, igualmente indignado.
E Pedro apenas ri. De vez em quando tosse um pouco, porém na primeira folga que tem ele volta a rir loucamente. Espero que ele não vomite.
“Merda!”, esbraveja Olívia.
“O que foi, Olívia?”, questiono. Há algo muito estranho com ela desde que saímos do bar do Pezão.
Ela faz menção de religar o carro. Detenho sua mão e, com meu olhar, cobro uma explicação.
Mas é Pedro quem começa a falar:
“Ela não acredita que acabou de ver a presidente do Brasil se requebrando toda na TV com umas roupas muito bizarras e cantando aquelas músicas ma-ra-vi-lho-sas!!”
E Pedro desanda a rir novamente.
“Como assim? Do que ele tá falando?”, pergunto, totalmente perdido nesse papo de porre.
“Confia em mim, Denner. A gente precisa ir embora. Quanto menos você entender, melhor”, assegura ela.
“Não, Olívia. Não!”, imponho-me. “Eu quero entender. Por que ele chamou a Joelma de presidente do Brasil? Eu sei que ele tá bebaço, mas você levou a sério o que ele falou. Que história mais doida é essa?”
Olívia me encara. Eu a encaro de volta. Não vou recuar. Ela tenta usar os olhos azuis intimidadores, mas não vão funcionar dessa vez. Nem que eles me matem aqui mesmo. Ou melhor, nem que ela me mate, pois certamente Pedro não está em condições sequer de se levantar desse banco do carro.
“Lá no apartamento você perguntou se nós éramos de outro planeta”, inicia ela e, pelo seu tom sombrio, começo a me arrepender de ter insistido em saber. “Bem, Denner, nós não somos de outro planeta. Mas também não somos do mesmo mundo que você. E de onde a gente veio, aquela banda que tava tocando na TV do bar não existe, porque aquela mulher que tava cantando e dançando é a presidente do Brasil. Tá contente agora? Pronto! Vamos seguir nosso caminho!”
Apesar de ter dito para seguirmos o caminho, ela não para de me fitar. Está esperando minha reação, eu acho. Mas... Como reagir a isso?
“Você tá me dizendo que vocês vieram de ‘outro mundo’ e que lá a Joelma é a... Presidente da nação?! Ela é tipo a Dilma de lá?!”
“Não vou repetir”.
“Cara...”
“Vamos embora!”
“Cara...”
Como uma entidade que invade um corpo desprevenido, uma granada de risadas explode em mim, de dentro pra fora. E fica impossível segurar as gargalhadas. E elas prosseguem num crescendo estupendo, incontrolável, imparável. Quando me dou conta, estamos Pedro e eu morrendo de rir. Não sei ao certo do que ele está rindo. Entretanto, eu estou me acabando em risos por já ser tarde da noite e eu estar longe de casa com um casal que dias atrás conspirava a respeito de me matar. Estou me acabando de tanto rir porque a vida te apronta cada sacanagem que, na maior parte das vezes, a única arma que ela te oferece para lidar com isso é um belo e histérico ataque de risos. E você não precisa entender exatamente o porquê, você simplesmente embarca e desfruta do quanto certas coisas conseguem ser tão incompreensivelmente cômicas.
O carro ainda está parado. A razão? Olívia foi contagiada pelo ataque crônico que se apoderou de mim e já havia se apoderado do parceiro dela. Última coisa com que eu poderia contar hoje à noite: Olívia Dantas, durona e impenetrável como o mais resistente diamante, agora revelando uma brecha de fragilidade num riso livre e puro.
Correndo o risco de ser assaltados nessa estrada escura, tudo que fazemos é rir, rir e rir muito, livre e escandalosamente. Minha barriga já está me incomodando de dor, mas quanto mais eu me esforço pra parar, mais eu me divirto.
Patinhos surgem em minha mente. Uma fileira longa, da qual não consigo enxergar o fim. Sim, tenho de nutrir esse pensamento agora. Está difícil, em meio a tantas gargalhadas, porque num descuido eu poderia deixar escapar a ideia que eu tive algumas horas atrás. A ideia peculiar que, mais do que isso, é perigosa.
A ideia que envolve me livrar de Pedro e Olívia da forma mais eficiente que consigo imaginar. O pensamento mais espantoso que eu jamais imaginei que pudesse passar pela minha cabeça, mas que me veio devido à gravidade da situação: o pensamento de matar pessoas.

Porém, para todos os efeitos, há apenas patinhos em minha mente, cruzando uma rodovia repleta de carros, grasnando alegremente. E eu continuo rindo sem a menor intenção de parar. 

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